Fundada em 1991 em torno de um garimpo, a cidade paraense de Cumaru do Norte é a mais violenta dos 772 municípios da Amazônia Legal. Sua taxa de mortes violentas intencionais foi de 141,3 mortes a cada cem mil habitantes entre 2021 e 2023. É seis vezes mais do que a brasileira, de 22,8 mortes.
Os dados inéditos estão na 3ª edição do estudo Cartografias da Violência na Amazônia, feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Instituto Mãe Crioula. Mortes violentas intencionais é uma categoria criada pelo Fórum que inclui homicídios, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e mortes em decorrência de intervenção policial.
Publicado na manhã desta quarta-feira (11), o levantamento mostra que, das 50 cidades mais violentas dos nove estados da Amazônia Legal, 19 estão no Pará. O estado registrou 32,8 mortes por 100 mil habitantes em 2023. A expansão da fronteira com a construção de rodovias, como BR-163 (Santarém–Cuiabá) e a BR-230 (Transamazônica), é uma das principais explicações para os altos índices de violência no estado. Nesses locais, segundo o estudo, conflitos fundiários e exploração de commodities são produtores de violência e violações de direitos territoriais.
Já no sudeste do Pará, onde está Cumaru do Norte e Abel de Figueiredo, as duas cidades mais violentas do estado, a dinâmica da violência se dá em função dos conflitos entre agropecuaristas e populações tradicionais que brigam pela posse da terra contra o avanço do monocultivo, principalmente da soja.
O Cartografias da Violência na Amazônia apresenta um cenário preocupante de conflitos em torno do controle, uso ou posse da terra que têm produzido homicídios e outras dinâmicas criminosas, bem como danos irreparáveis à biodiversidade amazônica. Mais recentemente, o controle das facções criminosas ligadas ao narcotráfico impôs novos patamares de violência.
— As organizações passaram a explorar todo e qualquer produto que gere retornos muito altos, que tenham como fundamento a questão do controle do território. Para ter essa força, elas precisam ter controle do território, seja na comunidade do Rio de Janeiro, seja na quebrada de São Paulo, seja na selva . No caso da Amazônia, é preciso ter o controle da rota toda da droga. Com esse controle da rota, começam a explorar o uso da terra, a abrir pasto para atividades de loteamentos clandestinos, trazer gado, explorar o ouro… O eixo estruturador é o território — destaca Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
A mais violenta
Cumaru do Norte é um pequeno município, de 14.036 habitantes, segundo o IBGE, no Sudeste do Pará, a 993 km da capital Belém. Em suas terras, vivem mais de 4 mil indígenas na Terra Indígena Kayapó. O município faz fronteira com Santana do Araguaia, Santa Maria das Barreiras, Redenção, Bannach, Ourilândia do Norte e São Félix do Xingu.
“Até hoje, o garimpo é o principal motor da cidade, a ponto de Cumaru do Norte ter ampliado sua infraestrutura, contando atualmente com a presença de uma pista de pouso. Além de atividade econômica, o garimpo que acontece em Cumaru e seu entorno é também um problema social, uma das causas da violência na região. Mas não é a única. Os conflitos fundiários, especialmente entre os garimpeiros e os indígenas da TI Kayapó, também marcam as dinâmicas violentas do município. A extração de madeira em Cumaru do Norte, por exemplo, é um negócio que exerce pressão sobre a TI na disputa pelo recurso natural”, diz o estudo.
Na tentativa de conter os conflitos entre garimpeiros e indígenas e reduzir o contrabando do ouro, criou-se o conhecido Projeto Cumaru, sob a responsabilidade do Conselho de Segurança Nacional. A área foi militarizada, com a presença de agentes do antigo Serviço Nacional de Informações (SNI) e da Polícia Federal.
Recentemente, Ibama, Funai e Polícia Rodoviária Federal deflagraram na região a operação Xapiri Tuíre, com a destruição de maquinários e produtos utilizados por garimpeiros na TI Kayapó.
( o Globo )
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