Os desafios da nova gestão em relação a previdência social e receita, em Barreirinhas

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Dois assuntos que passaram (bem) longe das discussões travadas no período eleitoral pelos candidatos – quando não pelo profundo desconhecimento dos temas, ou, pela simples observação de que tais matérias podem ser jogadas para “baixo do tapete” ou simplesmente esquecida na prateleira das propostas de gestão – são: 1 – o tema da RECEITA municipal e, por segundo, o tema da PREVIDENCIA SOCIAL (em nosso município) que, inobstante sua aridez e pouco interesse para a população, têm que ser colocado no seu devido lugar, tanto por sua importância, como por seu efeito (positivo ou negativo) na capacidade de uma gestão futura.

Tratarei, aqui, com pequeno apuro, inicialmente do tema previdenciário.

Em linhas gerais, o rombo na Previdência apresenta alguns fatores que são comuns a todos os regimes, seja o Regime Geral ou os Regimes Próprios. É que, com maior acesso a saúde e a informação, as mulheres tendem a engravidar mais tarde e ter menos filhos, o que leva ao declínio da taxa de fecundidade. Há também um aumento significativo na expectativa de vida dos brasileiros. Esses dois elementos contribuem para o alargamento da razão de dependência, que é a relação entre o número de servidores ativos e o de inativos, incluídos os aposentados e pensionistas.

Nesse quadro, de acordo com estudo elaborado pela Instituição Fiscal Independente (IFI), entre os anos de 2006 e 2015 o número de servidores estaduais inativos cresceu 37,9%, enquanto o número de ativos caiu 3,4%. Aliado a isso, o valor do benefício médio pago aos inativos elevou-se em um terço, devido ao aumento que aposentados recebem sempre que os servidores da ativa têm reajuste. O sistema, ademais, permite que servidores se aposentem antes dos 60 anos. Com isso, por exemplo, em Santa Catarina, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul o número de inativos já supera (em muito) o de ativos.

Por fim, há ainda que considerar a existência de categorias que garantem regras vantajosas aos segurados esta­duais, especialmente os professores e os policiais, que têm direito a aposentadoria precoce e benefícios em valor próximo ao da remuneração do servidor na ativa. “Os municípios ainda não estão na mesma penúria dos estados, mas sua pirâmide etária também vai se inverter e as prefeituras correm o mesmo risco de quebrar”.

Nesse contexto, a criação de programas federais ao longo dos anos revelou-se um problema para a previdência dos Entes municipais, além da incompatibilidade entre as competências constitucionais e a partilha dos recursos. Para realce de tal, sabe-se que a União tem 800 mil servidores e os Municípios têm 7,6 milhões porque as demandas foram passadas às prefeituras.

Não há exagero algum nessa sentença. O que (já) está ruim fatalmente vai piorar, pois cada Estado terá de fazer sua própria reforma: serão 27 discussões em assembleias estaduais, e outras 2 100 batalhas em câmaras de vereadores para alterar os regimes próprios de previdência dos municípios. Ou seja, uma discussão sem fim em um momento que exige ajustes urgentes.

Por conta desses dois apontamentos, principalmente, os Municípios com Regime Próprio de Previdência Social (RGPS) estão com dívida de R$ 248 bilhões e juntando com as prefeituras com Regime Próprio de Previdência (RPPS), o valor devido chega a R$ 500 milhões. “O déficit atuarial dos Entes municipais é de R$ 1,1 trilhão, e isso mostra um desequilíbrio”.

Na verdade, a autonomia municipal, prevista na Constituição Federal de 1988, só existe no papel, pois não ocorreu a descentralização de recursos e com a mudança recente promovida no Sistema Tributário Nacional (os Municípios, até hoje, só arrecadam três tributos) somado ao o aumento das demandas repassadas às prefeituras sob alegação de aumento na participação do bolo tributário, como o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) que passou de 17% para 22,5% dos Impostos Renda e Sobre Produtos Industrializados (IR e IPI).

O problema atinge pequenos e grande municípios. É ver o quadro

 

Para desespero geral, esse drama fiscal atinge em cheio, também os Estado:

 

Assim, não se precisa de muito apuro técnico atuarial para observar o caos que diversos gestores, pela incapacidade ou irresponsabilidade de um populismo barato, negligenciou observar que a Administração Municipal tem demonstrado uma grande dificuldade para implementar algumas mudanças pontuais na gestão previdenciária, todas, necessárias (e, por dizer, inadiáveis) desde a Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro 2019 e que são de extrema relevância e essenciais para a sustentabilidade o Regime Próprio de Previdência de Barreirinhas.

 

Ocorre que, não obstante a falta de compromisso com a saude economica do instituto previdenciário, é de se ressaltar (e lamentar) a escalada de deterioração das finanças municipais após sucessivas quedas na receita decorrente do Fundo de Participação dos Municípios, ocasionando atrasos e/ou o não repasse das contribuições obrigatórias.

 

Nesse ambiente hostil, o RPPS de Barreirinhas se encontra (desde fevereiro de 2022) em situação de déficit financeiro, fato que se agravou (e, muito em 2023) devido a sucessivos reajustes salariais concedidos aos servidores municipais, extensíveis aos aposentados do BARREIRINHASPREV.

 

Para tanto, ressalte-se que até o início deste ano (2024), a rentabilidade das reservas ainda conseguia suprir o mencionado déficit. Tal circunstância já era em parte prevista em função do não atendimento das exigências legais decorrentes do Artigo 40, da CF/88 com redação dada pela EC 103/2019, a saber, a adequação das alíquotas de contribuição mínimas para 14% e a adoção de novas regras de concessão de benefícios consideradas necessárias para conter o aumento progressivo da folha de pagamento de aposentadorias e pensões.

Abaixo, temos o histórico (ano fiscal 2023) relativo ao mencionado déficit financeiro:

 

 

MÊS

RECEITA DE CONTRIBUIÇÃO DESPESA COM BENEFÍCIOS DIFERENÇA
01/2023 1.096.723,00 1.191.100,40 –      94.377,40
02/2023 1.075.632,32 1.208.283,99 – 132.651,67
03/2023 1.073.458,18 1.219.610,47 – 146.152,29
04/2023 1.069.533,60 1.265.816,16 – 196.282,56
05/2023 1.151.088,20 1.355.937,34 – 204.849,14
06/2023 1.108.959,44 1.419.524,44 – 310.565,00
07/2023 1.107.980,98 1.357.179,34 – 249.198,36
08/2023 1.107.137,18 1.369.597,20 – 262.460,02
09/2023 1.149.507,46 1.434.966,23 – 285.458,77

 

Nesse quadro geral, registre-se que o RPPS de Barreirinhas possui, sem dúvida, um histórico preocupante em relação aos Custos Gerais do Sistema Previdenciário, visto que, desde a sua criação em 2011, nenhuma medida foi tomada pelo Ente para equacionamento do déficit atuarial. O Estudo Atuarial realizado em 2018 – não registrado no CADPREV – já apontava um déficit atuarial de R$ 178.564.712,58 apesar de termos um resultado financeiro positivo de R$ 3.655.342,27 no exercício de 2017. Naquele momento já se recomendava a implantação de uma alíquota suplementar 5,5% para os exercícios de 2018 e 2019, resultando uma alíquota patronal de 16,50%.

 

Destaca-se no estamento constitucional o seguinte:

 

Art. 40. O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preserve

 

equilíbrio   financeiro   e atuarial.   (Redação     dada                                     pela       Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

(…)

  • 20. É vedada a existência de mais de um regime próprio de previdência social e de mais de um órgão ou entidade gestora desse regime em cada ente federativo, abrangidos todos os poderes, órgãos e entidades autárquicas e fundacionais, que serão responsáveis pelo seu financiamento, observados os critérios, os parâmetros e a natureza jurídica definidos na lei complementar de que trata o § 22. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

(…)

  • 22. Vedada a instituição de novos regimes próprios de previdência social, lei complementar federal estabelecerá, para os que já existam, normas gerais de organização, de funcionamento e de responsabilidade em sua gestão, dispondo, entre outros aspectos, sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

I – requisitos para sua extinção e consequente migração para o Regime Geral de Previdência Social; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

II – modelo de arrecadação, de aplicação e de utilização dos recursos; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

III – fiscalização pela União e controle externo e social; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

IV – definição de equilíbrio financeiro e atuarial; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

V – condições para instituição do fundo com finalidade previdenciária de que trata o art. 249 e para vinculação a ele dos recursos provenientes de contribuições e dos bens, direitos e ativos de qualquer natureza; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

VI – mecanismos de equacionamento do déficit atuarial; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019

 

VII- estruturação do órgão ou entidade gestora do regime, observados os princípios relacionados com governança, controle interno e transparência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

VIII- condições e hipóteses para responsabilização daqueles que desempenhem atribuições relacionadas, direta ou indiretamente, com a gestão do regime; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

IX- condições para adesão a consórcio público; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

X – parâmetros para apuração da base de cálculo e definição de alíquota de contribuições ordinárias e extraordinárias. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

 

Complementarmente, a Lei Federal 9717/1998, regulamenta o funcionamento do RPPS na seguinte forma:

Art. 1º. Os regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal deverão ser organizados, baseados em normas gerais de contabilidade e atuária, de modo a garantir o seu equilíbrio financeiro e atuarial, observados os seguintes critérios:

I – realização de avaliação atuarial inicial e em cada balanço utilizando- se parâmetros gerais, para a organização e revisão do plano de custeio e benefícios; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.187-13, de 2001)

Nessa lógica e em conformidade com os ditames da legislação vigente, a gestão do RPPS de Barreirinhas precisa adotar urgentemente as novas alíquotas estabelecidas na EC 103/2019 e, complementarmente, através do adequado estudo atuarial, implantar um plano de custeio que indique o equacionamento do déficit financeiro e atuarial.

Face ao delicado da situação, é importante ainda sugerir a realização de estudos de viabilidade para aplicação do disposto no artigo 249, da CF88, que prevê a utilização de bens, direitos e ativos no equacionamento do equilíbrio financeiro e atuarial, a saber:

 

 

Art. 249. Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento de proventos de aposentadoria e pensões concedidas aos respectivos servidores e seus dependentes, em adição aos recursos dos respectivos tesouros, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão constituir fundos integrados pelos recursos provenientes de contribuições e por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei que disporá sobre a natureza e administração desses fundos. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

 

Não obstante, enquanto as providências legais mencionadas não sejam tomadas, cabe ao Ente fazer a cobertura financeira do déficit mensal de modo a complementar os valores das despesas com os benefícios de aposentadorias e pensões.

Dessa forma evitaríamos a perda de Reservas Constituídas, de modo a não prejudicar mais ainda o já fragilizado equilíbrio do sistema previdenciário de Barreirinhas.

Sem mais, colocamo-nos à disposição para os esclarecimentos necessários.

 

 

Vitélio Shelley Silva

 

 

 

 

 

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