O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), diverge em vários pontos nesta quarta-feira (10/9) dos colegas Alexandre de Moraes e Flávio Dino em julgamento que decide se o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados executaram uma trama golpista contra a eleição de Lula (PT). Em seu voto, Fux disse que “não se pode banalizar o conceito de organização criminosa”. Discordou também que os réus tenham cometido os crimes de deterioração do patrimônio tombado.
Com os votos do relator e de Dino, o placar na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) está em 2 x 0 pela condenação dos réus.
Fux derrubou o crime de organização criminosa armada, alegando que, no caso, deveriam ter sido usadas armas de fogo – fato não relatado pelo Ministério Público. Além disso, segundo o ministro, a denúncia não narrou em qualquer trecho que os réus pretendiam praticar delitos reiterados, de modo estável e permanente.
“A imputação do crime de organização criminosa exige mais do que a reunião de vários agentes para a prática de delitos, a pluralidade de agentes. A existência de um plano delitivo não tipifica o crime de organização criminosa”, ressaltou Fux.
Com isso, o ministro adiantou que não deve votar pela condenação de Bolsonaro e aliados pelo crime de organização criminosa. O magistrado, porém, afirmou entender que os denunciados pela PGR cometeram ao menos o crime de concurso de pessoas.
Mais cedo, ao retomar, às 9h10 desta quarta-feira (10/9), o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete aliados, Fux defendeu, nas preliminares, a “incompetência absoluta” do Supremo Tribunal Federal (STF) para analisar o caso dos acusados de planejar uma tentativa de golpe e impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022.
“Sinteticamente, o que vou me referir é que não estamos julgando pessoas com prerrogativa de foro. Estamos julgando pessoas que não têm prerrogativa de foro. O fundamento apontado nas preliminares é a ausência de prerrogativa de foro”, destacou Fux ao analisar a preliminar sobre a competência de o STF julgar o caso.
Além disso, Fux defendeu que o julgamento do caso deveria tramitar em primeira instância e, se fosse no STF, que ocorresse no plenário. “Ao julgar em uma das turmas, estaríamos silenciando a voz de ministros. A Constituição diz que somos 11 ministros. Seria necessário julgar pelo plenário com a racionalidade funcional que temos”, ressaltou o ministro, defendendo a nulidade de todos os atos praticados pelo STF.
Além disso, Fux apontou o cerceamento da defesa no processo, acolhendo uma terceira preliminar. O ministro defendeu, porém, a manutenção da delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid.
Após as preliminares, Fux vota o mérito do processo. Caso siga o relator, Alexandre de Moraes, o STF formará maioria pela condenação dos réus. Nessa terça-feira (9/9), os ministros Moraes e Flávio Dino votaram pela condenação de Bolsonaro e aliados.
“Não compete ao STF realizar julgamento político. Não se pode confundir o papel do julgador com o agente político”, afirmou Fux antes de proferir o voto. “(É) Compromisso ético do julgador, reafirmando que a Constituição vale para todos”, completou.
No caso de Fux, o magistrado é visto pelo núcleo bolsonarista como uma possível esperança de divergência em relação a Moraes, principalmente no que diz respeito às penas.
Embora tenha manifestado discordâncias em outros momentos sobre o uso da delação premiada do ex-ajudante Mauro Cid como prova central e sobre a competência da Primeira Turma para conduzir o caso, o Metrópoles apurou que a chance de o ministro apresentar pedido de vista nesta ação penal é considerada remota.
Após Fux, votam os ministros Cármen Lúcia e o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin. Eles terão os dias 11 e 12, das 9h às 19h, para apresentar seus posicionamentos. No fim, será feita a dosimetria das penas, quando a punição exata para cada réu é definida.
Os crimes
Todos os oito acusados respondem por atuar contra a ordem democrática. Sete deles são investigados por cinco crimes:
O deputado Alexandre Ramagem (PL), ex-diretor da Abin, responde a três acusações, mas teve duas delas suspensas pela Câmara dos Deputados por estarem relacionadas a fatos posteriores à diplomação.
Quem são os réus do núcleo crucial
- Jair Bolsonaro: apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como líder do grupo, teria comandado o plano para se manter no poder após ser derrotado nas eleições.
- Alexandre Ramagem: acusado de disseminar informações falsas sobre fraude eleitoral.
- Almir Garnier Santos: ex-comandante da Marinha, teria colocado tropas à disposição da trama em reunião com militares.
- Anderson Torres: ex-ministro da Justiça, guardava em casa uma minuta de decreto para anular as eleições.
- Augusto Heleno: ex-ministro do GSI, participou de transmissão ao vivo questionando urnas eletrônicas.
- Mauro Cid: delator do caso e ex-ajudante de Bolsonaro, participou de reuniões e trocas de mensagens sobre o golpe.
- Paulo Sérgio Nogueira: ex-ministro da Defesa, teria apresentado a comandantes militares um decreto de intervenção redigido por Bolsonaro.
- Walter Braga Netto: único preso, acusado de financiar acampamentos golpistas e de planejar atentado contra Alexandre de Moraes.
Acusação
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, defende a condenação de todos os oito réus. Já as defesas dizem que os clientes são inocentes.
O PGR afirmou: “Tem-se, até esta altura provada, na cadeia de fatos, a consumação da ruptura democrática”.
“Está visto que, em vários momentos, houve a conclamação pública do então presidente da República para que não se utilizassem as urnas eletrônicas previstas na legislação, sob a ameaça de que as eleições não viessem a acontecer, bem como atos de resistência ativa contra os seus resultados”, acrescentou.
Gonet afirmou ainda que Bolsonaro e aliados não conseguiram lidar com o inconformismo em perder as eleições e, por isso, tramaram para que houvesse um golpe no Brasil.
“Os golpes podem vir de fora da estrutura existente de poder, como podem ser engendrados pela perversão dela própria. O nosso passado e o de tantas outras nações oferecem ilustrações dessa última espécie: o inconformismo com o término regular do período previsto de mando costuma ser fator deflagrador de crise para a normalidade democrática provocada pelos seus inimigos violentos”, salientou o procurador-geral.
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