Ah, a chuva! Esse fenômeno tão aguardado (principalmente por nós nordestinos), mas que, para muitos, é sinônimo de caos e desesperança.
A cada gota que cai, a paisagem se transforma, e o que antes era apenas uma rua agora se torna um verdadeiro rio que invade as casas e molha até os ânimos mais esperançosos. O cenário – passa ano atrás de outro – é o mesmo, mas a frustração parece sempre mais profunda. A pergunta que ecoa: quem é o verdadeiro responsável por esse estado de abandono? São Pedro, com seu espírito benevolente, é o último a ser culpado. Mas, então, quem?
É interessante como essa cidade, com suas ruas que viram verdadeiros córregos – a cada primeiro sinal de precipitação – é agraciada com um estado de abandono que, se não fosse trágico, seria cômico. E ao invés de políticos preocupados com a melhoria das condições básicas de vida, o que se vê é um foco cada vez maior nas inaugurações de praças, escolas e postos de saúde. Estes são, sem dúvida, essenciais. Mas quem precisa de uma praça quando a água já está invadindo a sua sala? Quem se importa com um posto de saúde novinho, se o esgoto não escoa e sua rua se torna um ponto turístico de inundações a cada chuva?
A questão é que o problema básico da infraestrutura das cidades permanece invisível para aqueles que deveriam estar tomando as rédeas da situação. Canos de esgoto, bueiros entupidos e a falta de um sistema de drenagem adequado, por mais importantes que sejam, não são atrativos para as campanhas eleitorais. E, convenhamos, quem se lembra de um cano de esgoto novo? Se não dá para colar uma faixa, se não há foto, se não há inauguração com faixas e pompa, então não é prioridade.
O que realmente importa é o que pode ser mostrado nas câmeras e vangloriado nas redes sociais.
Na prática, o que se vê, ano após ano, é um processo de esquecimento da base. O que os cidadãos de nossa cidade (realmente) precisam não são promessas de novos marcos arquitetônicos ou de mirabolantes obras que nunca saem do papel. O que eles pedem, com urgência, é um olhar atento para as estruturas que já existem, que estão à beira do colapso. As mesmas estruturas que, quando faltam, transformam uma chuva inocente em um verdadeiro pesadelo urbano.
E a ironia está justamente no fato de que, ao invés de se dedicar a esses problemas estruturais, muitos prefeitos, governantes e políticos em geral preferem aplaudir suas próprias obras, as que podem ser tocadas, tocadas de novo e novamente, mas que, no fundo, pouco importam quando a água já tomou conta da casa. E é justamente nesse momento que o povo percebe o quanto nada do que foi prometido faz diferença quando a situação é de emergência.
E assim, as estações se alternam: o tempo de sol vem com o governo eleito, carregado de promessas de modernização, prosperidade e novas construções. Mas, quando a chuva chega, o único lugar para onde as promessas desaparecem é no esgoto que não foi feito.
Enfim, é fácil ser voluntarioso e prometer um futuro brilhante quando a campanha eleitoral ainda está em alta, quando a expectativa ainda é maior do que a entrega real. Mas, no momento em que as nuvens escuras tomam o céu, o que se vê são ruas alagadas, vidas comprometidas e uma triste repetição do que já vimos antes.
Quem nunca presenciou a cena de uma rua alagada, esperando desesperadamente que a água desça para que os móveis não precisem ser “levantados” mais uma vez? Quem nunca olhou para o céu e pensou: “A história se repete”? E, claro, a solução parece sempre tão distante. Não é a falta de recursos que impede a solução. A verdade é que, por mais que seja conveniente inaugurar asfaltos ou escolas, não se pode esquecer que, por baixo de tudo, o fundamento básico de uma cidade são suas infraestruturas invisíveis – como os esgotos que ninguém quer olhar e as ruas que, para a gestão, não têm a mesma atração que as belas placas de inauguração.
Já se passou muito tempo, e o que é mais triste: a história se repete a cada nova chuva. Não é de agora que se sabe que investir em saneamento economiza em saúde. Mas será que nossos gestores já notaram isso? Ou será que, na busca incessante por likes nas redes sociais e no brilho das promessas de campanha, o que realmente deveria importar continua sendo ofuscado pela fotografia da inauguração de mais um monumento?
Quem deve, então, ser responsabilizado? Certamente não São Pedro, que apenas faz seu trabalho com a mesma naturalidade de sempre. Mas, sem dúvida, aqueles que têm o poder de resolver, mas preferem deixar para depois. O problema não é a chuva. O problema é quem está fazendo chover sobre as expectativas de quem mais precisa: o povo.
Editorial Imaranhão
+ There are no comments
Add yours